Guilherme Peres Messas1 A participação da genética nas dependências químicas
Rev Bras Psiquiatr
"Através da revisão de estudos em famílias, em gêmeos e de adoção, encontramos evidências para afirmar a importância dos fatores genéticos na transmissão da vulnerabilidade às dependências. Essa transmissão pode ser melhor compreendida através de um modelo epigenético de desenvolvimento do transtorno onde condições biológicas hereditárias associem-se a situações ambientais ao longo da vida para a produção da dependência. Neste artigo apresentamos essas condições biológicas intermediárias vinculadas ao alto risco para dependência, focadas no caso do álcool e da cocaína. Por fim, descrevemos os estudos moleculares que vêm estabelecendo associações entre polimorfismos e as dependências, com relevo para o sistema dopaminérgico. O estudo do componente genético nas dependências químicas sofre da mesma dificuldade experimentada pelos demais transtornos da psiquiatria: a indefinição fenotípica, ou seja, a dificuldade de delimitar fronteiras claras para as categorias diagnósticas. (pág.33).
No caso das dependências químicas (lembrando que nos fixaremos aqui aos casos de álcool e cocaína) portanto, devemos falar, em nome do rigor lingüístico, de genética das condições de vulnerabilidade ou suscetibilidade. Este modelo, compreendendo a herança genética das vulnerabilidades e sua modulação ao longo dos anos pelos efeitos ambientais, é chamado de modelo epigenético. Para o suporte sólido do modelo epigenético é necessário que estudos demonstrem o componente genético de outros fenótipos associados às dependências: os fenótipos de vulnerabilidade ou de alto risco. (pág.34)
Diversas condições de suscetibilidade vêm sendo demonstradas para dependência de álcool, podendo ser grosseiramente repartidas em dois subgrupos: As relativas ao traço de personalidade e aquelas relacionadas à ação bioquímica da droga no organismo. Assim, encontraram evidências para uma vulnerabilidade genética comum para transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, gagueira, tiques, transtorno de conduta e obsessivo-compulsivo, mania, ansiedade generalizada e abuso de álcool. (pág.35).
Os dependentes de cocaína, assim como no caso da dependência de álcool, apresentam uma maior prevalência de história familiar de abuso de substâncias, problemas prévios de personalidade e transtornos de comportamento na infância, levando a pensar num grupo de suscetibilidade geral a dependências químicas, resultado consoante ao encontrado nos estudos de adoção acima apresentados. Assim, é possível sustentar como hipótese que as características de traços de personalidade encontradas nos estudos de suscetibilidade a alcoolismo sirvam também para explicar ao menos uma parte da suscetibilidade à dependência de cocaína, ficando a outra parte devida às peculiaridades da ação bioquímica da droga no organismo". (pág.35).
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